terça-feira, 20 de outubro de 2009

Conservador

O ser humano é incrível. É impressionante a capacidade que ele tem de ser conservador.
Certo dia, aprendemos algo, muito provavelmente um ensinamento que já traz implícito um ponto de vista, uma ótica. E sobre isto aprendemos daquele modo, e o tomamos como verdade. E pronto. Mas a vida é muito dinâmica, e aquele mesmo ensinamento é ensinado a uma outra pessoa, no entanto, com outra ótica. Esta outra pessoa o toma como verdade. E pronto. Até aí, nada de mais. A diversidade de opiniões enriquece o debate e amplia a capacidade de raciocínio.
Só que, eu dizia, o ser humano é incrivelmente conservador. E o encontro entre estas duas pessoas, cada uma com a sua bagagem, não vira um rico debate, mas uma disputa pelo título de real dententor da propriedade da mais absoluta verdade. Ninguém abre mão do que crê ser verdade, ninguém aceita a possibilidade de o que julga saber ser tão verdade quanto a verdade dos outros, muito menos que seja menos verdade.
É isso que gera alguns preconceitos, por exemplo. Em muitos dos países que se alinharam ao lado capitalista, na chamada Guerra Fria, ser comunista é algo como ser leproso, mas sem hospital especializado. No próprio país que encabeçou esta face do conflito ideológico, os Estados Unidos, a forma mais eficiente de se abaixar a popularidade de um político é acusá-lo de realizar gestos socialistas ou socializantes. Ainda é pior do que ser associado ao terrorismo, o grande vilão dos EUA nos últimos tempos. E olha que a guerra fria acabou no século passado!
Eu também não estou livre do conservadorismo. Nem sequer gostaria de estar, pois há coisas que devem ser conservadas pelo máximo de tempo possível. Não como os obsessivos personagens de Huxley, ou o papa Bento XVI, com a ilusão da total estabilidade e da verdade eterna e imutável. Mas não posso deixar de encontrar resistências a algumas mudanças. Quem quer trocar a segurança do que já é certo pela incerteza de algo que pode ou não obter um sucesso futuro? Resisto, assim, a determinadas mudanças em minha vida pessoal, a específicas mudanças na carreira acadêmica ou profissional, ou a mudanças na ortografia oficial. Pôxa, eu sempre fui bom em ortografia, e agora tenho que reaprender uma tuia de coisas!
Mas, ao pensar novamente, e com mais calma e serenidade, somos obrigados a admitir que os chineses estão certos há milênios, desde muito antes do que sonhamos. Não é novo para eles o conceito de que tudo muda o tempo todo. Não é que Parmênedes estivesse errado (e em meu ponto de vista, estava certíssimo), mas que Heráclito de Éfeso acertou em cheio! Acho, até, que ele devia ter em algum lugar um amuleto do Yin Yang consigo para onde ia. De fato, o equilíbrio é apenas um breve (infinitesimal) estágio entre um e outro desequilíbrio. Você pode retardar a mudança, nunca impedi-la. Tudo passa, e essa sensação de finitude, de que a humanidade, e, pior, a sua vida vai acabar tira qualquer um do sério.
Por outro lado, não temos que ficar como loucos, viciados, como canso de ver, em novidades. Outro dia, ouvi que o mal dos conservadores não é ser conservadores, mas não saberem o que conservar. Eu queria descobrir o autor desta frase magnífica, e, quem sabe, de algum modo cumprimentá-lo (ainda que no post mortem) por tamanha genialidade. É uma verdade interessante. Um exemplo: o fim do trema, aqueles pontinhos que fazem um "u" parecer dois "i"s, vai legitimar quem já falava "qüestão" ou "trankilo", quando não são estas as reais fonéticas. E os malucos excessivamente liberais já pregam o fim do nosso querido e insubstituível ponto-e-vírgula. Já o fim ou introdução do hífem entre determinadas palavras, com todo o respeito, nem cheira nem fede, serve apenas para unificar a língua portuguesa entre os países lusófonos.
Então, afinal de contas, somos conservadores, mas nem sempre. Nosso erro, talvez, é não querer conservar o amor, determinados valores morais (como a honestidade, o respeito et coetera), a natureza (a conservação desta é tema para longas crônicas, porque é relativa), por exemplo, enquanto se quer conservar preconceitos, valores morais negativos (como a inveja e a xenofobia et coetera) e um sem fim de coisas inúteis e até prejudiciais.
É incrível a capacidade humana de fazer de seu conservadorismo um veneno sem antídoto.


Pablo de Araújo Gomes, 20 de outubro de 2009

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Miserável

É incrível a capacidade humana de ser miserável! Não me refiro à miserabilidade de pobreza. Esta é a condição intrínseca que nasce conosco: nascemos pobres, mesmo que em berço de ouro, e eventualmente não vivemos na pobreza; a prova é que é muito fácil te tirar tudo que tens, num estalar de dedos, pois nada te pertence... Mas lá vou eu, como sempre, em delongas! Eu dizia que o homem (gênero humano, sim?) pode ser muito miserável, no sentido de ser cruel e desprezível. Ah, isso, sim...
Aliás, repare como conseguimos personificar a própria Lei de Murphy: se você puder ser mau a um desafeto, mau você será, e da pior maneira possível! Estou mentindo? Não creio. Deixe idéias hipócritas para fora deste debate, assuma o seu verdadeiro eu, pois ninguém está lendo seus pensamentos!
Há infindáveis exemplos capazes de comprovar o alto grau de miserabilidade humana! Eu, mesmo, quantas vezes submeti formigas de espécies diferentes a outros formigueiros (principalmente se fosse um formigueiro de formigas-de-ferro), somente para comprovar, mais uma vez, com rigor científico que ela seria capturada e morta pelas sentinelas da colônia?
Aliás, esta pequena crueldade ainda tinha um fim científico. Tenho pena dos pintinhos da ingênua vizinha de meu pai (séculos atrás, quando ele era um moleque muito criativo, lá pelos seis anos). Ingênua, porque atribuía o desaparecimento dos filhotes de sua galinha à ação de uma suposta raposa, cobra ou outro animal dado à rapina. Era o sacana do meu pai que, para incrementar o pequeno "cemitério de pintos" que "administrava", matava mais um. Ainda bem que pintos, aqui, não se trata de um eufemismo! Valei-me!
De fato, estes dois últimos exemplos podem sugerir que o problema seja de família. Eu percebi. Para me redimir, sugiro que observem as conversas de banheiro das moçoilas, que para lá não vão desacompanhadas: "Você viu o vestido da Joana, que coisa R-I-D-Í-C-U-L-A?!?!", ou "Meu Deus, Mário não se enxerga, mesmo!! Você viu ele dando em cima de mim?". Não menos cruéis que as mulheres (cujos piores pensamentos não tive coragem de revelar, se é que os piores que eu conheço são realmente os piores), há também inúmeros ditadores na história da humanidade: quem não ouviu falar em Gengis Khan, crudelíssimo imperador mongol que assombrou o império Chinês e outros mais? Ou Hitler, que parece, certamente, com a sogra de alguém que você conhece? Ou, pior, Stálin, que conseguiu ser mais cruel que Hitler, talvez quase tanto quanto aquela ex-namorada de um amigo seu... Enfim... nada contra as garotas. Por favor, não se ofendam... Eu só queria mostrar que não estou sozinho com meus parentes neste negócio miserável. E é só.
É melhor eu parar por aqui. Acho que me fiz entender, e quanto mais eu falo (escrevo), mais me comprometo. Até a próxima, se eu for capaz de sobreviver à miserabilidade humana!

Pablo de Araújo Gomes, 2 de Outubro de 2009