quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Palavras Secas

Palavras são só palavras.
O que eu diria da palavra sexo há cinco anos? E há três? Não se parece em nada com o que diria hoje. Sexo já não existe para mim, hoje. É como uma quimera, uma fênix, uma fada: uma possibilidade encantadora, mas pura lenda. Como a fênix, a fada, ou o Papai Noel, se lhe produzem filmes, ergue-se-lhe estátuas e obeliscos, mas não deixa de ser uma ficção, dessas que até chegamos a desejar, não sem alguma vergonha de acreditar.
E o amor? Ah, que palavra doce! “Eu te amo”, não importa a língua, deve ser a frase mais dita no mundo. Palavras tão vazias, é o que acabam sendo! O que se diz, o que se faz em nome do amor, e mesmo o que se faz a despeito do amor que se diz sentir, são coisas não raro espúrias.
Pessimista, eu? Não o diria. Aliás, pessimismo é uma palavra que tem sido oferecida aos que não se perdem em sonhar o inatingível. Ou, significado que tem sido esquecido, mas muito mais apropriado, aqueles que conseguem a proeza de ver o mundo ainda pior do que o é na realidade.
Eu me definiria, na verdade, como um romântico. Bem, isso há alguns anos atrás. Hoje, sou pragmático! Não, não, meu querido leitor, minha cara leitora, não prego ou venero as pragas. Pragmático é aquele que é prático, vai direto ao ponto, compreende que dois mais dois é igual a quatro, e não vive como se pudesse ser cinco. É uma forma triste de se viver, mas tem funcionado melhor do que o oposto, o romantismo de anos atrás.
Em verdade, como romântico, eu era feliz. Chorava mais, é certo, mas não por sofrer mais. Havia tempo para tal, e até certa honra em chorar. Hoje, eu sinto-me seco. Não me falta vontade de chorar, mas não vejo objetivamente em que isso possa ajudar. Então, simplesmente não me cai uma lágrima, sequer. Ser pragmático, no fundo, não foi uma escolha de vida, mas uma espécie de movimento involuntário do destino. Não me restou alternativa: foi uma espécie de imposição da vida para a minha sobrevivência.
Não, não, não! Não me olhe você com essa cara de pena, e nem você outro com este ar de descrença! E não ousem lançar-me olhares de reprovação! Se lhes falar de mim, a fundo, verão traços de egoísmo, inveja e outras dezenas de defeitos nada nobres. E poderão, erroneamente, odiar-me por isso. E lhes direi, como se lho justificasse, que são um grito de liberdade de um ego sufocado por uma acontecimentos infelizes, e, certamente, orarão por minha alma. Nunca entendi a adoração que se faz aos que sofrem. Pelo menos, não depois de morrer para meu passado romântico. Na natureza, quem fica chorando é devorado, enquanto quem luta devora. Como saber se a vítima era boazinha? E se quem a vitimou é o vilão? Não o são, necessariamente, como também não espere certezas sobre o inverso.
Aliás, vamos combinar de esquecer esse maniqueísmo oco! Existem, sim, coisas boas e coisas ruins, coisas certas e coisas erradas. Não é tudo tão relativo assim. Mas o bem e o mal? Não existem, como não existem soluções mágicas para resolver este dilema. E, sim, sob esta perspectiva, mais do que afirmar que é relativo, posso dizer sem medo: não existe! O bem e o mal são relativos ao ponto de vista de quem os vê, à escolha de um lado para posicionar-se num embate inútil. E inútil, claro, porque tudo traz, invariavelmente, e ainda que em proporções variadas, o bem e o mal.
Você, certamente, já não pensa em mim com pena, ou ódio. Provavelmente, na verdade, já procura uma lista telefônica, para ligar para um hospício. Crê-me louco, é certo. E é certo que está errado! Todo louco diz isso, eu sei, mas nunca antes estive tão lúcido. O que, talvez, me permite ter a certeza de que digo besteira. Não é possível ter uma certeza infalível, nem ser ou estar completamente lúcido. Esqueça este parágrafo sem razão de ser, por favor!
Eu, então, dizia, que as palavras não são nada. Ou, melhor, que são apenas palavras, o que é, na certa, bem mais do que nada. Elas ferem um espírito sensível, ou o acariciam como nada. Ao meu espírito, fere este silêncio que se tornou minha vida, mas não palavras. Não mais, eu acho. Talvez o modo como elas são ditas me atinja muito mais que as palavras em si.
Já o silêncio, que faz de mim um homem solitário, é muito mais do que o silêncio. As palavras me saltam da boca, ou dos cotovelos. Ou dos dedos, direto ao teclado em que digito este texto. Mas o silêncio representa a solidão, a frustração, a descrença. Por isso, ser pragmático, já que o menor sinal de sonho e esperança é tolhido e sufocado. O silêncio é um sinal de meu estado de espírito, e está, enfim, por trás de cada palavra que transborda do vulcão que se tem tornado meu turbulento espírito. E a cada coisa que digo, contraditoriamente, alimento o silêncio de onde pululam palavras que preciso dizer a todo instante... e digo-as, como agora, a ninguém.
Nos outros momentos, só me resta agir, calado. Ou disfarçando com palavras o meu estado.

Pablo de Araújo Gomes, 12 de novembro de 2008